Fechamos 2021 com nove vacinas para Covid-19 aprovadas para uso no mundo, e mais 19 em uso limitado ou emergencial, de acordo com dados do New York Times. É certamente motivo de comemoração, e devemos celebrar a ciência construída em tão pouco tempo. Essa rapidez, aliás, é fruto de intensa colaboração internacional e de investimento sem precedentes da iniciativa privada e de filantropia.
Mesmo com a chegada da variante Ômicron, que realmente parece ser bem mais contagiosa que as anteriores, porém não tão eficiente em causar doença grave, sabemos que as vacinas seguem nos protegendo de hospitalização e morte. A Ômicron tem se mostrado capaz de driblar vacinas, contagiando imunizados. Mas, ainda assim, as vacinas seguem “segurando a onda”, reduzindo muito o risco de que os vacinados, quando contaminados, sofram complicações.
O surgimento de uma variante como a Ômicron, com seu escape de vacinas, vem nos lembrar do que já sabíamos e vinha sido repetido exaustivamente por cientistas do mundo todo, e principalmente por representantes da Organização Mundial da Saúde: precisamos de um plano de vacinação global, incluindo os países pobres, ou veremos o surgimento de mais variantes em locais onde o vírus ainda circula livremente.
Pois 2022 traz a esperança de uma vacinação global mais inclusiva. Semana passada, a vacina Cobervax, desenvolvida nos Estados Unidos, recebeu autorização de uso emergencial na Índia, após reportar resultados satisfatórios na fase 3 dos testes clínicos. O teste de fase 3 foi feito por “não inferioridade”, comparando a nova vacina a uma outra já aprovada — no caso, a Covishield, de vetor adenoviral, desenvolvida pela AstraZeneca e Universidade de Oxford. Esse tipo de teste é o padrão para quando já existem vacinas aprovadas no mercado, uma vez que seria antiético conduzir um ensaio com grupo placebo. Os dados ainda não foram publicados, mas os resultados parecem bons: de acordo com os desenvolvedores, a Cobervax foi superior à Covishield em produção de anticorpos neutralizantes.
O mais interessante da nova vacina, no entanto, não é ser superior ou igual às que temos no mercado, mas, sim, o fato de ela ter sido feita com uma tecnologia bastante conhecida, barata e muito fácil de replicar e distribuir em qualquer local do mundo. A Cobervax foi pensada para ser uma vacina global, equitativa. Mais do que buscar ser a melhor vacina em termos de eficácia, ela foi pensada para cumprir um papel social.
A tecnologia utilizada é similar à vacina de hepatite B, velha conhecida e amplamente utilizada no mundo todo. Trata-se de uma vacina de subunidade proteica, ou seja, utiliza uma proteína do vírus de interesse. No caso, a Cobervax utiliza uma parte da proteína S do Sars-CoV-2. Esta proteína é produzida, para a vacina, por leveduras geneticamente modificadas, uma técnica barata e fácil de reproduzir. Após a produção pelas leveduras, a proteína é purificada e utilizada na formulação vacinal, junto com adjuvantes, substâncias que vão ajudar a provocar a resposta imune necessária. A vacina de proteína ainda vem com a vantagem de poder ser armazenada e transportada em temperatura de geladeira comum, facilitando a logística de países que não têm redes de cadeia de frio bem estabelecidas.
A vacina foi licenciada, sem patente, para a empresa Biological E. Limited, e foi desenvolvida com financiamento de filantropia. Os pesquisadores principais, Peter Hotez e Maria Elena Bottazzi, disseram ao jornal Washington Post que esperam que a Índia seja só o começo, e estão negociando com a Organização Mundial da Saúde para que a Cobervax possa ser utilizada em mais países. Os pesquisadores não pretendem lucrar absolutamente nada com a venda da vacina. É um sopro de esperança para a vacinação global em 2022.
FONTE: O Globo | Natalia Pasternak